Inquietude latente dançando no
compasso do descompasso. A melodia de uma saudade enclausurada me cega da luz
radiante. Acordei após uma embriagada noite de paixão, murmuro por perdão para
a saudade torturante me libertar. Como dói descer a ladeira de sentimentos e tocar a
campainha da melancolia. O seu encontro sempre deixa rastros. Se existe algo
que aprendi com essa menina é sobre a dor. E ela, como uma grande criação é
dotada aflição. Apesar de seu pesar, é dela que se transforma em uma obra de
arte. Jovem como o vento que surrupia a censura imposta pelas saias longas.
Jovem e cansada de correr. Jovem e carregada de dissabor. Ontem o dia não foi
fácil, como qualquer dia da vida essa ninfeta. Seu cotidiano maçante lhe é empregado
sem delongas.
Hoje também é árduo. Trilhar o obscuro
caminho esburacado do incerto sempre causa alguns tropeços. Os olhos movem-se através dos óculos que procuram a precisão na estrada do breu acompanhada pelo
insolúvel pavor que brota nos pés. A frouxidão das pernas é escancarada pelo
caminhar vago e demorado. Se havia compreendido algo em sua vida é de que
estamos acordando continuamente de sonhos que demoram a se concretizar. A
imaginação se dá por horas, o despertar ocorre em segundos. O que fazer então
quando não há o antecessor? O que fazer
quando o sono não vem? A madrugada se torna a mãe acolhedora que passa em todos
os leitos do mundo, sussurrando o silêncio, retribuindo o barulho moribundo do
eco de pensamentos densos, aglutinados, porém dispersos, desleixados, mas bem
nutridos.
As olheiras se tornam barcos e os
olhos navegantes a se aventurar pelo que a noite reserva. Tudo e nada não
bastam. Tudo ainda é pouco, nada é um pouco de tudo. Nesse minuano carregado de
trovoadas encobertas de reflexão, no meio do olho do furação, dentro do redemoinho que
faz a cabeça dar giros, traz a tona os medos mais íntimos, das entradas da
inocente infância, das entranhas do aconchego materno. Caso em suma, o
proposito seja se perder então, objetivo concluído. Uma boa noite de sono faz
toda diferença. O devaneio causado pela insônia procura a cura de hematomas
antigos. As fachadas de cada machucado são abertos em vão. Esse fogo morto
dentro de mim, essa natureza mortífera que é o cérebro e seus agentes, os
pensamentos, conseguiram o golpe do ano. Parte de mim foi assassinada. O
objetivo talvez fosse apenas a morte de meu sono, mas ao levantar das cortinas,
ao ver o sol se por, senti falta do meu ânimo para recomeçar o dia, da vida que
estava aqui e foi tirada sem avisos, nem bilhetes. Tirada de mim, sorrateiramente.
Beliscando as paredes do meu consciente, embora sorridente, somente tivesse a
tristeza sem fim.