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Projeto de escritor. To sempre de malas prontas pra lugar nenhum por que até hoje não achei casa alguma dentro de mim. (Pra saber mais, clique ali em Quem eu sou, à direita)

domingo, 24 de março de 2013

Novo dia

Novamente seria uma noite longa. Podia prever que não seria uma conversa fácil. Os passos na escada anunciavam a sua vinda, mesmo que Pablo continuasse a desenhar. Ao entrar no quarto se escorou na porta e ficou apenas observando aquele homem magro e concentrado. Por um momento nada foi dito, apenas observado. Como as pequenas imperfeições da ponta de seu lápis, os traços levemente tortos e as milhares de folhas caídas pelo chão. 
- Então, vai ficar aí?
Não foi ouvida nenhuma resposta. Provavelmente a conversa tomaria rumos que todos gostariam de evitar. Mas mesmo assim era preciso, necessário. Algumas coisas na vida são necessárias, mesmo que doam muito, e por muito tempo.
- Olha, eu vou sair, e espero que você me acompanhe.
- Eu não vou a lugar nenhum - retrucou.
- E vai fazer o que? Ficar aí, desenhando a noite toda? Olhe para você, parece um fantasma. De tanto tempo que está aí parado certamente poderia se transformar em parte da mobília. Todos nós sabemos o que aconteceu, mas nada justifica vocÊ se esconder no seu quarto e transformá-la em uma caverna em que nenhuma luz ou pessoa entra. Você está muito tempo aí e precisa sair. O mundo está lá fora...
- O meu mundo acabou, faz tempo. Não há nada lá fora para mim - interrompeu-o
- Ok, e o que você fez para mudar isso? Dê uma chance a você mesmo. Dê uma chance às pessoas lá fora. Você simplesmente construiu essa realidade e aposentou a vida real, aquela que lhe pode tirar daí. Tudo o que você respira é dor, está envolto por lembranças e essas lembranças vão te matar, se é que ainda restou algo aí. Nesse quarto há um conglomerado de  memórias, sonhos interrompidos e decepções. Isso tudo o impede de seguir. Seu quarto é um reflexo seu, é um vazio cheio de coisas que não pode suportar. Você não lê mais, pois a única palavra que reconhece no momento é 'vergonha'. E essa vergonha te impede voltar a viver. Você não desenha mais pois tudo o que sabe fazer é repetir os mesmos traços do rosto dela e tudo o que você vê é distorcido, não há tanto mal assim, apenas aquilo que você carrega. Eu ainda espero que você saia desse quarto algum dia.
Pablo acordou assustado do seu sonho. Olhou para o lado e viu seus livros, olhou para baixo e visualizou suas folhas no chão. Eram 7 e meia, segundo o relógio. Levantou as persianas e abriu a janela. Deixou um pouco de sol entrar como não fazia meses. Era um novo dia.


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