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Projeto de escritor. To sempre de malas prontas pra lugar nenhum por que até hoje não achei casa alguma dentro de mim. (Pra saber mais, clique ali em Quem eu sou, à direita)

domingo, 30 de junho de 2013

Bom dia

            Tenho sonhos confusos, alguns às vezes se repetem. Nesse, eu estou imersa pela água que bate nas paredes de cor margarina do meu quarto que não é meu quarto. Eu estou deitada ou boiando, não sei ao certo, mas sinto a água bater na minha face como uma marolinha. Não chega a assustar, não tenho medo de me afogar, até é reconfortante, a adrenalina pulsa dentro de mim nos litorais da acomodação. Desejo me manter ali, inerte, sendo levada pelo sono profundo e pelo movimento. A limpidez é assustadora, vejo agora meus objetos boiando também, outros mergulhados e tantos outros me rodeando. Entre tudo isso há uma televisão grande que se mantêm no mesmo lugar embora a água faça força para movê-la. Aquela enorme tela tem uma luz grande e um chiado baixo que quase não se escuta. A tela parece ser a casa de vaga-lumes que se mexem sem parar, parecem mais agitados que eu. Nervosos, se batem contra a tela, voam errado, voam estranho, voam baixo. Não sinto meus olhos embora eu tenha visão, não sinto minha consciência, deve estar naufragando com os produtos nessa peça, mas sei que estou pensando.
            A luz é ensurdecedoramente cegante. Os ruídos se intensificam de tempos em tempos que parecem controlados cronologicamente por algo de fora do quarto, ou deste sonho. A água é palpável, mas se esvai de minhas mãos. Me agarro aos entulhos que vão para baixo. Minha tentativa de me apoiar neles é nula. Continuo calma, porém agora respiro profundamente. “O que eu estou fazendo aqui? Isso é um castigo? Se fosse um sonho bom já poderia acabar agora, né? Por que estou imóvel? E essa TV, de onde veio? Pra onde isso vai?”. Isso é tudo o que se passa pela minha cabeça. Me arrisco a dizer que ela ainda está no mesmo lugar. Sinto que um pedaço de mim morre por dentro a cada questionamento. Será que é isso a morte? Mas e ela, vem de um quarto? Não consigo pensar direito, não consigo pensar bem. Como um flash, nas entranhas do meu córtex reluz a minha última indagação. E se minhas sinapses que começam a se ligar entre uma e outra estão certas, isso tudo é apenas um reflexo meu. Olha só, até faz sentido. É como eu sempre me senti durante toda minha vida, sufocada. Evitada pelas multidões e grupos de amigos, desprezada pelos ex-namorados, tendo minha voz abafada pelo som dos socos de meu pai em minha mãe, emaranhada por toda a confusão que a vida criou pra mim. Toda sinergia aplicada em um propósito nulo. É do estrago que vim e ao estrago retorno, meu lar, aonde me adono. O rímel preto começa borrar com a chegada das lágrimas. Meus olhos parecem torneiras que inconscientemente se abrem para encher aquela piscina de lamentações. Meu corpo gélido combinando com a água fria que toca meus seios frágeis e nus. Até eles, sempre foram preterido por outros mais fartos.
A morte não parece tão ruim. Aliás, a morte parece uma saída para um lugar melhor. Qualquer indício me leva ao suicídio coletivo, meu e das minhas memórias. Naquele quarto estão cartas e fotos, calças e moletons, sonhos e esperanças, vivências e tragédias. Nada realmente é como pensamos, nem mesmo a vida. Eu não desejo sonhar essas coisas, mas também não as nego. Volto ao meu travesseiro e o agarro com força. Naquele momento ele é a única coisa a qual eu posso me segurar. Companheiro de noites mal dormidas, de pensamentos vexaminosos, lágrimas e desabafos. Nele eu ponho a cabeça tapando a visão. Fecho os olhos, tudo escuro. Ainda tenho minha audição e ela me diz que a água não desapareceu, assim como a TV. Mesmo sem os olhos abertos, é possível perceber a luz cega e percebo o esforço dos vaga-lumes. Eles não cessam, a luz amedronta, o silêncio dá espaço para pensamentos que se dirigem como facas ao meu estomago emocional. Como dói viver, como dói sentir. Tento imaginar uma situação positiva. Quem sabe de manhã nada disso estará assim? Quem sabe a melancolia me abandonará e as palavras surgirão, empurrando os pensamentos inóspitos para baixo do tapete desse quarto. Quem sabe, ninguém sabe. Me perco para me encontrar, eles me perderam para me ganhar, tudo se esvai para um dia voltar. Como a luz do sol, ao me acordar. Bom dia.

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